Minha mãe sempre gostou de usar colar. Geralmente aqueles de bolas grandes e coloridas, combinando com os brincos. Quando pensamos em comprar um presente pra ela, a primeira coisa que nos vem à mente é, sem dúvida, um colar. Tentamos dar a volta a esse impulso, afinal é preciso ter uma certa criatividade para presentear, mas, no final, acabamos caindo na tentação da certeza de agradar e compramos um colar. Justamente por isso, ela tem muitos. Abre-se a porta do guarda-roupa e veem-se, pendurados como terços no altar da igreja, os mais variados tipos: prateados, dourados, coloridos, de couro, de plástico e, claro, pérolas, muitas pérolas...
Quando mais jovem, ela não saía
de casa sem o adereço, nem que fosse para ir à venda da esquina. Não se rendia
às havaianas, dava sempre um jeitinho no cabelo e tascava colar e brinco,
sempre arrumadinha. Tanto que, ela mesma me contou, foi acusada pelas más
línguas da vizinhança de que queria se exibir para os homens da rua. Claro que
não. Era só cuidado mesmo ou, palavrinha comum atualmente - autocuidado. E
lá ia ela, de sacolas plásticas repletas de economias e de contas coloridas no
pescoço.
Lembro-me em especial de um de
bolas de vidro de vários tamanhos, predominando o cor de rosa clarinho, alternadas por bolinhas douradas. O fecho era lindo,
daqueles de encaixar, cravejado de pedrinhas imitando diamante, e eu abria,
fechava, abria, fechava, encantada com o clique delicado que ouvia. Como ela
ficava linda quando o usava! E eu vira e mexe estava com ele nas mãos, olhando,
admirando, imaginando, com muito cuidado para não quebrar.
Já eu nunca fui de usar colar. Na
adolescência, quando eu ia sair, minha mãe me olhava, observava o look dos pés
à cabeça, hesitava um pouco, mas não resistia e, com um sorriso irônico nos
lábios, dizia: “Nem um colarzinho?!” Eu negava terminantemente e ela ficava bem
decepcionada, querendo ver em mim um pouco daquele brilho especial que coloria
e alegrava o seu dia.
Em homenagem à minha mãe, nos
últimos tempos (o que significa depois de muito tempo), resolvi comprar uns
colares, decidida a usá-los no meu dia a dia. Então, numa viagem, comprei uma gargantilha
de corais sicilianos, que são como umas pedrinhas irregulares, em tom meio alaranjado, e resolvi usar já no mesmo dia. Escolhi um vestido neutro, para dar destaque ao colorido do colar. Passei um batom na mesma tonalidade, coral, e, ao olhar-me no
espelho, me senti bonita. Tirei uma selfie, mandei para a minha mãe e saí pra
jantar feliz da vida. Não tenho dúvidas de que era por causa do colar.
Quando cheguei em casa, li o
comentário materno: “É bem delicado!” Entendi perfeitamente o significado: era demasiadamente
delicado para ela. Claro, para agradar, eu deveria ter escolhido um de bolas
grandes...
Um dia, procurando na internet,
vi um colar de bolas. Eram feitas de argila, confeccionadas artesanalmente. Não muito grandes
e não tão coloridas. Os tons eram acinzentados, mais claros, mais escuros, com duas
unidades em preto, uma só em branco e apenas uma bolinha menor dourada, que para
mim dava um toque especial à composição. O cordão era de couro branco, bem
delicado, e, delimitando o conjunto de sete ou oito bolas, havia duas continhas
também douradas. Amei aquele colar. Era a minha versão mais discreta daquele de vidro cor de rosa da
minha mãe, que eu tanto admirava.
Ficou guardado durante muitos
meses no armário, até que um dia acordei sem muita inspiração para me vestir.
Abri todas as portas do meu armário, olhei, pensei. Sabe aqueles dias em que só
queremos renovar todo o nosso guarda-roupa? Me deu um desânimo mesmo. E acabei
optando por uma camiseta branca, básica, e uma calça preta. Sapatilhas pretas. Look mais sem graça não havia. Mesmo assim, ainda troquei de blusa duas
vezes, por outras duas brancas. E básicas. Continuava insatisfeita, achando que
o dia estava perdido. Pouco antes de sair, ao fechar as portas do armário, vi a
pequena caixinha preta num canto da prateleira, estrategicamente disposta mais
à frente, para não ser esquecida. Era o meu colar adormecido, pronto para
despertar. Tirei-o da caixa, desenrolei-o cuidadosamente e dispus sobre a blusa
branca, dando o charme que eu queria ao visual.
Combinou perfeitamente,
equilibrando o preto e branco com os tons cinzentos, com destaque para a
continha dourada que praticamente somente eu via. Me senti toda paramentada, um
pouco over. Mas por que não me dar a chance de me enfeitar um pouco mais,
homenagear a minha mãe e, afinal, também despertar.
Saí do quarto um pouco
desconfiada. Não gosto de chamar a atenção. Envolvidos na correria matinal, ninguém reparou. O marido, atento
ao mínimo detalhe, não percebeu. A filha caçula, sempre a primeira a observar a
cor do esmalte, a blusa nova, o corte de cabelo, não viu. A mais velha, crítica
ao extremo, não falou nada. É... minha mãe teria razão ao comentar: “Nem uma
corzinha, minha filha?!” Talvez fosse discreto demais.
Mesmo assim, meu dia se tornou melhor.
Comprovei o que minha mãe, sem dizer, sempre quis me ensinar: que um simples colar
muda a nossa disposição, nos faz sentir especiais e mais bonitas, nos dá
alegria e confiança. É mágico.
Envolvida pelo trabalho, nem me
lembrei mais da arma poética que estava no meu pescoço, mas a energia que
exalava daquelas bolas transformava a vida, dando a ela um toque de encantamento
discreto, quase secreto.
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