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Imagem retirada do site da BDB |
A minha paixão por bibliotecas vem de longa data. Pequenas ou monumentais, simples ou esplendorosas, antigas ou modernas, elas com certeza são o meu refúgio onde quer que eu esteja.
Em Brasília, sem dúvida alguma, a que mais frequentei foi a Biblioteca Demonstrativa (que faz parte do Ministério da Cultura - Diretoria do Livro, Leitura, Literatura e Bibliotecas). Por ficar muito perto da casa onde eu morava nos anos 80 e 90, esse era o lugar para onde eu fugia para estudar, ler ou simplesmente lá estar.
A construção singela, baixa e retangular, de cor branca, com letreiros em dourado e uma pequena marquise sobre a porta de entrada, integra a paisagem da avenida W3 sul e recebe cerca de 700 usuários diariamente. A roleta de entrada leva ao balcão de informações, empréstimos e devoluções. No centro da construção, a sala principal de leitura, com mesas de estudo cercadas por estantes baixas para os livros de referência, como dicionários e enciclopédias. Na entrada, à esquerda, uma sala dedicada à literatura infantil e outra com o acervo principal, também local de leitura e de estudo. À direita, um cantinho que já foi livraria, café e espaço de leitura infantil, além de salas para fins diversos, como a administração, a tesouraria (quem nunca devolveu com atraso?), o xerox, salas de conferência e um pequeno espaço de exposições. Ali, e também na sala principal, aconteciam saraus, concertos e premiações de concursos literários, sendo intensa a atividade cultural desse espaço. Atrás do balcão de empréstimos, ao centro, uma simpática gibiteca, com seus jovens e solitários leitores.
Comecei a frequentar a Biblioteca Demonstrativa no início dos anos 90, quando, devido a uma desilusão amorosa, fiquei de recuperação em duas ou três matérias e, para estudar, precisava fugir do barulho que fazia na minha casa durante o mês de dezembro,
com a chegada dos irmãos e sobrinhos. Gostei do conceito
“ambiente de estudo”, da presença constante dos livros e, sozinha ou em grupo
de amigos, me tornei frequentadora assídua. Passava horas entre os
corredores escuros e apertados, observando os exemplares, sentindo o cheiro dos livros, do qual me lembro até hoje, escolhendo a próxima leitura ou o apoio para os estudos.
Na verdade, a Biblioteca,
nessa época conhecida como Instituto Nacional do Livro, o INL, não era nada organizada. Qualquer um podia entrar (até mesmo
mendigos e rapazes não muito bem intencionados ), e as salas de estudo pareciam mais uma feira: era uma
barulheira sem fim, todos conversando em voz alta, rindo, paquerando, um entra
e sai constante e até vendedores de rosquinhas e salgadinhos passeando por entre as
mesas. Quem queria estudar a sério tinha de escolher outro lugar.
O tempo passou, estudei em várias instituições de ensino, frequentei suas respectivas bibliotecas, mas nunca deixei de ir à BDB. Quando
voltei à cidade, depois de alguns anos fora, a Biblioteca era
fisicamente a mesma, mas uma campanha iniciada, se não me engano, pela Biblioteca Central da
Universidade de Brasília, associada à era dos concurseiros e à necessidade de estudar pra valer, transformou a feira em templo
de estudo. Singelo, é verdade, mas silencioso, convidando à concentração e à aprendizagem. O silêncio tomou conta do espaço (assim como das outras bibliotecas da cidade), de tal maneira que um espirro passou a gerar constrangimento. Os ficheiros para pesquisa, antes anotada em pedacinhos de papel toscamente recortados, foram substituídos por computadores. Intensificou-se o
cuidado com os frequentadores (nunca mais vi práticas indevidas ou amorais por
lá) e substituíram-se as mesas e cadeiras antigas. A lateral externa esquerda do prédio ganhou um charme a mais - o mural em mosaico, com os versos de Nicolas Behr, poeta da cidade:
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Imagem retirada do site Cris Guerra |
Com barulho ou silêncio, a Biblioteca Demonstrativa de Brasília fez
parte da minha vida. Na companhia dos amigos ou dos livros, dos funcionários cujos nomes infelizmente não sei (É a única biblioteca no mundo em que reconheço algumas faces, a mim muito familiares), vivi muitos momentos especiais lá. Guardo no coração os dois cursos de Contadores de Histórias
que frequentei no período da noite, os quais nos levaram a viajar para o mundo dos
contos de fadas e das narrativas orais e fantásticas. No último dia, todos narravam suas histórias, emprestadas ou
inventadas, e era uma grande festa! Certa vez, me vi encurralada entre as
prateleiras de livros, o final de uma das alas e meu recém ex-namorado acompanhado da nova namorada. Nesse dia, pensei que a Biblioteca não tinha sido legal comigo, mas na verdade ela me prendeu ali para me fazer enfrentar o inimigo de frente.
Por todas essas lembranças, foi com enorme tristeza que recebi a notícia da interdição da
Minha Biblioteca no início deste ano. Por razões de
segurança, até mesmo os funcionários foram proibidos de entrar, e a devolução
dos livros têm sido feita por uma portinha dos fundos. Parece que uma reforma
já está encaminhada. Que seja rápida! Que a burocracia em nosso
país não deixe esse espaço, que faz parte da identidade da cidade, abandonado.
Que logo logo aquela porta possa se abrir, que a Biblioteca possa receber seus milhares de leitores, novos e antigos, e continue a contar sua história.
No dia 16 de maio, ocorreu um abraço simbólico da comunidade em torno do prédio. Como não pude participar, receba este texto como um
abraço bem apertado, Biblioteca Demonstrativa, em sinal do meu apoio e gratidão. Quando eu voltar, espero te encontrar renovada e viva como sempre. Até breve!
Imagem retirada daqui |
PS: Quem quiser ajudar a preservar a BDB, acesse este link e assine a petição pela sua reforma e modernização.
Esta é a Biblioteca lá da Asa Norte? Se for... que pena.
ResponderExcluirDa Asa Sul. Mas com certeza é esta que você está pensando...
ExcluirA Demonstrativa não é vinculada, ela faz parte da Diretoria do Livro, Leitura, Literatura e Bibliotecas dentro da estrutura do Ministério da Cultura. O Setor de Projstos Especiais é um setor da Biblioteca e não da Diretoria.
ResponderExcluirObrigada pela correção. Acho que agora está correto.
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