segunda-feira, 17 de novembro de 2014

O guarda-chuva cor-de-rosa





Chovia hoje pela manhã. Uma chuva fina, até agradável, que não chegava a incomodar.
No pátio da escola, pais apressados procuravam despachar logo os filhos, crianças aflitas tentavam descobrir o caminho a seguir em um dia confuso como este, carrinhos, pernas e sombrinhas se atropelavam. Perto, um menino se despede da mãe. Percebe-se pelos olhos que ele faz um pedido, mas ela, entre as gotas que pareciam tornar a manhã tão mais complicada, dá uma resposta fria e impaciente: “Não é hora disso! Vai!”, vira-se e segue para não mais. O menino, desprotegido do guarda-chuva da mãe, para, petrificado. As feições tornam-se tensas, cada vez mais e mais, e ele começa a chorar. Um choro baixinho e sentido. O mundo todo se move apressadamente e ele ali, parado, sentindo as gotas gélidas sobre a pele delicada, misturadas agora ao choro morno de decepção e medo. A mãe já se foi, desapareceu para sempre, deixou-o sozinho e humilhado, sem saber que rumo seguir, sem saber como prosseguir.
Mal percebe ele que, ao seu lado, uma menina o observa. Uma menina de olhos grandes, castanhos, expressivos, curiosos. Com seu guarda-chuva cor-de-rosa, ela diminui o passo, obrigando as pessoas a se desviarem. Um menino frágil, coberto de lágrimas, triste. Uma menina forte, decidida, segura. Ela se aproxima bem devagar, aos pouquinhos, sem querer assustá-lo. Prepara-se cuidadosamente para a abordagem, abrindo um sorriso leve e afetuoso. Ela se aproxima, olhando-o sempre, a cabeça levemente caída para o lado. Seu olhar é terno e maternal. Ele, agora consciente da presença muito próxima, olha-a de lado, envergonhado. O choro vai cessando aos poucos. Ela se aproxima um pouco mais, os olhos meigos fixos no dele, o sorriso doce, e oferece, silenciosamente, um espaço debaixo do seu mundo cor de rosa. Provavelmente não é de proteger-se da chuva que ele precisa. Faltou uma palavra, uma resposta, um mínimo cuidado que a correria da manhã chuvosa não permitiu. Mas agora nenhuma palavra precisa ser dita. O olhar é firme, embora suave, e convida – primeiro a ficar, a estar, a compartilhar, em seguida a continuar. Ele hesita. Depois cede, e a feição se transforma, agora mais calma, como em uma espécie de contágio. Os ombros se tocam e, nesse momento, um pequeno mundo à parte se forma, cercado de uma aura de silêncio, cumplicidade e aconchego. Olhares fixos, espécie de ímã. Sorrisos em sintonia. Menino e menina voltam a caminhar devagar, depois um pouco mais rápido, como os demais. O pequeno mundo à parte se desfaz, e eles se confundem novamente com o pátio da escola. Tudo volta ao normal, agora sem choro, sem medo. Tudo se move, na rapidez necessária ao andamento do dia. Da maneira como tem de ser.
Apenas uma mãe, parada à distância, a observar, com um sorriso leve nos lábios e lágrimas nos olhos, se deixa ficar mais um pouco, paralisada pela aura de encantamento, emocionada com a gentileza espontânea, verdadeira, grandiosa e maternal da filha.

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