quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

Minha pátria, minha língua

Woman writing - Pablo Picasso
Mulher escrevendo, Pablo Picasso, 1934


O escritor português Marcello Duarte Mathias, diplomata e filho de diplomata, quando questionado sobre a influência da diplomacia em sua escrita, respondeu que, desde muito cedo, a escrita foi a maneira por ele encontrada de estar sempre em seu país, mesmo estando sempre distante.
Essa foi, para mim, uma ideia inspiradora. Meu país, minha gente podiam estar longe, mas minha língua, a língua portuguesa, essa melodia maternal e reconfortante, poderia ser uma maneira fabulosa de voltar ao meu lugar e, ao fim e ao cabo, a mim mesma. Afinal, se minha pátria é minha língua, escrever não seria o veículo mágico mais eficaz para lá me transportar mais rapidamente? 
Mathias disse também, na mesma ocasião, ter marcado muito a sua vida o fato de seu pai, embaixador, dizer para ele, ainda criança, referindo-se às residências oficiais em que moraram ao redor do mundo: Tá vendo esse copo, meu filho? Não é seu. Esse talher, esse prato? Nada disso é seu. Para além do louvável valor que esse pai dava à coisa pública, essa imagem expressa exatamente a sensação de quem mora fora e não pode voltar ao seu país com a frequência com que gostaria. Tá vendo essa casa, essa rua?  Não são suas. Essa terra, esse rio, esse céu? Nada disso te pertence. É como uma voz baixinha e irônica  te dizendo o tempo todo: não adianta plantar esse jardim; não tem como carregar tudo isso daqui a dois anos na mudança. É o sentimento de não pertencer ao lugar, a coisa alguma. 
Essa sensação de exílio, a língua materna pode ajudar a amaciar. A língua é minha, está em mim, posso levá-la para todos os cantos do mundo e, por meio da palavra escrita, estar na minha casa, sob o meu céu, ouvindo o rio da minha aldeia, plantando minhas flores, semeando minhas experiências, pensamentos, aprendizagens, sentimentos, livros, quadros, cidades... 
O limite? A minha pátria, a língua portuguesa.


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