Projeto haicais visuais, da fotógrafa Ana Rodrigues |
Desde
o ano de 1996, o mês de abril é considerado o Mês Nacional Poesia nos Estados
Unidos. Escolas, livrarias, bibliotecas, editoras e poetas reunem-se para celebrar a poesia e a sua importância na cultura
americana.
Este
ano, para comemorar, o New York Times pediu aos leitores que escrevessem haicais (poema curto, de origem oriental, composto de três versos de cinco, sete e cinco sílabas) sobre a cidade de Nova York. Em geral, os haicais são inspirados na natureza, mas esses poderiam inspirar-se nos seguintes temas: a ilha de
Manhattan, estranhos, solidão, deslocamentos diários, seis da manhã, gentileza
e outros deles derivados. Em dez dias, o jornal recebeu 2.800 poemas, dos quais alguns foram publicados na edição de 25 de abril.
Abaixo, reproduzo alguns dos meus preferidos (com tradução livre), aqueles com os quais, de alguma maneira, me identifiquei no que diz respeito à
representação da cidade e à sensação que ela me transmite. Ressalto que foram
criados por pessoas comuns, não necessariamente literatos e, portanto, não
seguem um sistema métrico rígido. São
uma espécie de brincadeira daqueles que vivem o quotidiano da
cidade.
O haicai (hai = brincadeira, gracejo; kai = harmonia, realização) descreve um momento, uma sensação, uma impressão, de maneira rápida, concisa, como o flash da máquina fotográfica, com muita simplicidade e singeleza. Não deixa de ser interessante ver esta cidade tão barulhenta, agitada e grandiosa inspirar uma forma poética tão sintética, simples, zen.
Face vista do outro lado dos trilhos
Nos
olhamos, e o trem passa
Face
perdida para sempre.
O
trem de manhã
tem
o melhor aroma do dia:
café
e shampoo.
Nossos
olhos se evitam
Se
nos olhássemos, veríamos,
Poderíamos
ser amigos.
O
taxista Ahmed
Costumava
ser um engenheiro
Sonho
americano?
Se
construção e destrução
São
notas musicais, nossa ilha
É a
sinfonia.
Solidão
na noite
Sozinho
no trem lotado
Muitos
corações, uma alma.
Dizem
que o nova-iorquinho
Não
é gentil. Eu digo:
Eles
apenas deixaram esse hábito em casa.
A
cidade é eterna,
Mas
não se deixe enganar.
Nunca
é a mesma.
Podemos
passar a noite
Juntos,
mas eu exijo
Bagels de manhã.
Aluguel muito caro.
Sou
obrigado a mudar para New Jersey
Onde
ninguém visita.
Se o
trem viesse agora
Eu
poderia chegar lá a tempo.
Mas
ainda estou na cama.
Eu
te conheço, não?
Você
era eu cinco anos atrás,
Sonhando
com Nova York.
Pizza
de um dólar
Um oásis
no duro deserto dos
Custos
de Nova York.
No
telhado, parado,
Soltando a pipa no céu
A
rua desaparece.
Um
momento de felicidade
Quando
o túnel rouba nossa WiFi
Relance
de liberdade.
Gentileza
é
Encostar
no ombro do outro
No
banco do metrô.
Há
lugares no
Central
Park, onde não se vêem
Prédios,
só árvores.
Todo
santo dia
Nós
nos cruzamos, mas eu nunca
Vou
conhecer você.
Metrô
lotado;
Ninguém
me conhece – conforto
E
aflição.
Mercado
da Union Square
Mirtilos
a dez dólares
Nova
York blues.
Flutua
na água,
Arranha-céus
de vidro em cima,
A
inquieta cidade.
Passeio no parque
Ainda não há narcisos florescendo – apenas
Casacos
desabotoados.
Se os poemas acima me inspirassem a escrever o meu haicai sobre Nova York, seria mais ou menos assim:
Que me leva ao sono tranquilo
Mas a cidade nunca dorme.
E você, qual é o seu favorito?
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